Manejo de Pragas Iniciais no Milho Safrinha

Por Ronaldo Luiz Gonzaga*

O ataque de pragas iniciais é um fator importante a ser considerado em função da capacidade de prejudicar o bom estabelecimento de lavouras, além de retardar o desenvolvimento inicial, reduzir o estande de plantas e, consequentemente, causar redução na produtividade das culturas como a do milho safrinha, por exemplo.

É ampla a gama de insetos-praga que existem e podem atacar o milho na fase inicial, envolvendo pragas de solo e pragas de parte aérea, de hábito sugador ou mastigador.

Pragas da fase inicial

Podemos descrever como pragas da fase inicial: cigarrinhas das pastagens (Deois flavopicta), tripes (Frankliniella williamsi), percevejo-castanho (Scaptocoris spp), lagarta-rosca (Agrotis ípsilon) e cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis). Porém, vamos relatar somente as que têm sido mais frequentes nas lavouras.

Pragas de solo

Dentre as pragas consideradas de solo temos a larva-angorá (Astylus variegatus) e os corós-do-milho (Liogenys sutural, Diloboderus abderus, Phyllophaga cuyabana).

Essas pragas podem atacar as sementes do milho logo após a semeadura ou as raízes após a emergência das plantas, com ocorrência mais expressiva em plantios com baixa umidade no solo. Nas condições de safrinha nem sempre conseguimos a semeadura com boa umidade para rápida germinação e emergência, assim, o tratamento de sementes se torna indispensável para auxiliar no manejo dessas pragas.


Imagem 1. Coró-do-milho (Liogenys sutural, Diloboderus abderus, Phyllophaga cuyabana).

Vaquinha

A larva-alfinete (Diabrotica speciosa) alimenta-se das raízes do milho. A estratégia mais viável é o controle preventivo do adulto (vaquinha). Em área com histórico da praga, aplicações de inseticidas à base de Clorpirifós ou Fipronil no sulco de plantio são efetivas como ferramenta de manejo.


Imagem 2. Vaquinha (Diabrotica speciosa).

Lagarta-Elasmo

A ocorrência da lagarta-elasmo (Elasmopalpus lignosellus) na safrinha está intimamente ligada a solos arenosos ou ocorrência de estiagem. O plantio de híbridos com proteínas Bt é uma importante ferramenta no manejo dessa praga. Aliado a isso, o tratamento de sementes com inseticidas a base de Thiodicarb ou Fipronil é uma medida preventiva que constitui e complementa o Manejo Integrado de Pragas (MIP). Em situações de alta incidência da praga, pulverizações a base de Clorpirifós podem ser realizadas no período noturno com alto volume de calda.


Imagem 3. Lagarta-elasmo (Elasmopalpus lignosellus).

Nas pragas de parte aérea, temos um dos maiores causadores de prejuízos observados nas últimas safras, os percevejos. Estes merecem atenção especial dos técnicos e produtores, pois têm se adaptado muito bem à sucessão soja/milho safrinha. Altas densidades de percevejos no final do ciclo da soja coincidem com a fase de implantação das lavouras de milho.


Imagem 4. Percevejo-barriga-verde (Dichelops furcatus e Dichelops melacanthus).

O percevejo-barriga-verde (Dichelops furcatus e Dichelops melacanthus) é o que causa os maiores e mais irreversíveis danos à cultura do milho. Devido à sua agressividade, trabalhos da Embrapa apontam que o nível de dano para o controle do percevejo-barriga-verde no milho safrinha é inferior a 1 inseto para cada 5 plantas de milho na lavoura.

Já o percevejo-marrom (Euschistos heros) têm seus sintomas de ataque menos visíveis, pois seu estilete é mais curto e dificilmente provoca danos severos com perfilhamento ou até mesmo a morte da planta.


Imagem 5. Danos médios de percevejo-barriga-verde.


Imagem 6. Danos severos de percevejo-barriga-verde.


Imagem 7. Espigas à esquerda provenientes de plantas com danos severos de percevejo-barriga-verde.

O controle de percevejos está intimamente ligado à adoção do Manejo Integrado de Pragas (MIP) no sistema produtivo como um todo. Ele se inicia com um efetivo controle e redução dos percevejos na soja, o que ajuda a reduzir as populações que migram para o milho safrinha ao fim do ciclo da soja.

Outra praga de grande importância é a lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda), com ocorrência generalizada e atacando todos os estádios de desenvolvimento da cultura.

O surgimento das proteínas Bt, adicionou mais uma ferramenta para controle da lagarta desta praga. Porém, essa ferramenta não deve ser usada de forma isolada e jamais a responsabilidade de controle ser delegada unicamente à proteína Bt.

As características da praga, tais como o alto potencial reprodutivo, o ciclo curto e a polifagia associadas à situação de sucessão de cultivos hospedeiros (soja, milho, feijão, sorgo) a colocam sob uma enorme pressão de seleção e em risco a durabilidade das proteínas Bt, fazendo necessária a adoção do MIP/MIR.


Imagem 8. Lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda).

Além do plantio de híbridos com tecnologia Bt, outras ações do MIP/MIR devem ser associadas, como manejo das plantas daninhas em pós-emergência, controle de milho voluntário, utilização do tratamento de sementes, monitoramento do nível de dano, rotação de culturas e a adoção do refúgio.

O controle químico via pulverização deve ser usado em complemento às demais ações do MIP/MIR, quando 10% das plantas atingirem nível de dano 3 na Escala Davis. Usando este nível de dano, o controle via inseticidas se torna mais efetivo, pois as lagartas estarão em ínstares menores (<1 cm).

Atualmente existem mais de 100 produtos registrados para o controle de S. frugiperda em milho, mas os principais grupos de inseticidas que têm sido usados são:
1. Carbamatos (carbaril, metomil e thiodicarbe);
2. “Fisiológicos” (lufenuron, diflubenzuron, triflumuron, novaluron e clorfuazuron);
3. Espinosinas (espinosade e espinetoram);
4. Diamidas (clorantraniliprole, flubendiamida).

Lembrando que esses grupos devem ser alternados a cada aplicação para evitar seleção de populações resistentes.

Vetor responsável pela transmissão dos enfezamentos

Responsável por causar prejuízos nas mais diversas regiões do Brasil a cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis) se tornou uma das maiores preocupações dos produtores de milho nas últimas safras.


Imagem 9. Cigarrinha-do-milho. Foto: Tino de Bortoli.

Essa espécie tem sido responsável por transmitir de forma persistente dois molicutes: o Enfezamento Pálido (Spiroplasma kunkelii) e o Enfezamento Vermelho (Maize bush stunt phytoplasma), além também da virose conhecida como Vírus da Risca – MRFV (Maize raiado fino virus).

É praticamente impossível separar a ocorrência dos 3 agentes a campo, por isso é comum tratarmos como complexo de enfezamentos e viroses em milho.

Multiplicação da praga-vetora

A multiplicação da cigarrinha e dos molicutes depende da cultura do milho, sendo que essa espécie não completa seu ciclo biológico em outras culturas como soja, sorgo e brachiarias como muito se ouve no campo.

A multiplicação da praga-vetora tem relação direta com a temperatura ambiente, assim, em maiores temperaturas proporcionam rápida multiplicação da cigarrinha, ocasionando em mais de uma geração do inseto dentro da cultura. A condição da alta temperatura também favorece a replicação dos molicutes na planta de milho infectada.

Importante lembrar que insetos eclodidos de ovos provenientes de adultos infectados com molicutes não apresentam infecção. Para a sua infecção, há necessidade de o novo inseto adquirir o patógeno ao se alimentar de uma planta infectada.

Uma vez infectados o inseto e as plantas permanecem assim durante todo seu ciclo de vida. Assim, as estratégias de manejo devem englobar a cigarrinha como vetor antes da infecção e a tolerância genética dos híbridos. Obviamente uma única medida de manejo para esse problema não será efetiva.

Medidas para minimizar as perdas com enfezamentos

A seguir vamos listar um conjunto de medidas para minimizar as perdas com enfezamentos nas lavouras de milho.

Manejo de plantas voluntárias (tigueras)

O milho é a única espécie capaz de hospedar a praga e os molicutes. A eliminação do milho voluntário nas lavouras de soja é crucial para não criar as chamadas “pontes verdes”.

Esse manejo serve para evitar as perdas de grãos de milho na colheita e as aplicações de graminicidas para o controle dos fluxos de germinação do milho.

Época de semeadura

Os primeiros plantios da safrinha têm uma forte tendência de sofrerem mais com a alta pressão de cigarrinhas infectadas oriunda de cultivos de verão, silagem e áreas irrigadas da região.

A cigarrinha prefere se alimentar e realizar posturas em plantas mais novas e áreas de milho. Como se trata de um inseto com alta mobilidade e dispersão, o aparecimento da cigarrinha ocorre à medida que são semeadas as lavouras, ocasionando um efeito de diluição nas lavouras de fechamento de plantio.

Assim, caso o agricultor utilize um híbrido mais suscetível aos molicutes, deve semeá-lo nas últimas janelas de plantio da região.

Tolerância genética de híbridos

Nos últimos anos a seleção de novos híbridos têm dado grande foco na tolerância genética aos molicutes. Os novos lançamentos já contemplam genótipos de boa tolerância e adaptados às regiões produtoras. Porém, não devemos delegar toda a responsabilidade de manejo somente à tolerância genética.

Conforme a pressão da praga, tempo de alimentação e da carga demolicute, um híbrido que foi tolerante em uma safra, pode não ser na próxima. Por isso, a necessidade de adotar medidas integradas de manejo. A seguir listamos alguns híbridos com mais e menos tolerância aos molicutes.

MAIS TOLERANTES MENOS TOLERANTES
P3707VYH 30F53VYH
P3898 30S31VYHR
P4285VYHR P1630VYH
P3754PWU P3380HR
P3397PWU P3431VYH
P3456
P3858PWU

Tratamento de Sementes Industrial com neonicotinoides

O uso do Tratamento de Sementes Industrial com neonicotinoides tem a função de proteger as plantas na fase inicial, que é a fase mais propícia para a infecção.

Quanto mais cedo a planta for infectada, maior será o dano para a produtividade final da lavoura, pois ocorre um tempo maior de multiplicação dos molicutes dentro dos vasos da planta. Essa prática deve ser utilizada em conjunto com aplicações complementares de inseticidas para maior efetividade.

Aplicações complementares de inseticidas para a cigarrinha

Essas aplicações tem por objetivo reduzir o número de cigarrinhas na lavoura e/ou retardar a entrada da praga com altas pressões até a cultura sair da fase mais crítica de infecção, que vai até V10. Aplicações com boa efetividade devem associar moléculas com efeito de choque e residual.

Como produtos de choque temos as opções de moléculas nos grupos químicos de Piretróides, Carbamatos e Organofosforados. O maior desafio reside nos produtos para dar efeito residual, já que na fase inicial o milho emite novas folhas em 2 a 3 dias.

As opções de moléculas com efeito residual contemplam os neonicotinóides (Clotianidina, Imidacloprid, Acetamiprid e Tiametoxan). Essas moléculas devem ser utilizadas em doses de 150 a 200 g i.a.ha-1 para proporcionar o efeito residual adequado.

Considerações finais

É importante verificar quais os produtos comerciais que possuem registro para a cultura do milho e lembrar que as aplicações de inseticidas, utilizadas de forma isolada, não serão suficientes para um manejo efetivo.

Nas condições de cultivo de um país tropical como o Brasil, temos sobreposição de cultivos que hospedam a mesma praga e geram a “ponte verde”. Esse cenário aumenta a complexidade do manejo e traz risco de seleção de biótipos resistentes, seja às proteínas Bt, inseticidas ou molicutes.

É necessário haver conhecimento e conscientização da cadeia produtiva sobre a necessidade da adoção das práticas integradas (MIP/MIR) para preservar as tecnologias e novos genótipos, para obtenção de maiores rentabilidades.

*Ronaldo Luiz Gonzaga é engenheiro Agrônomo, Doutor em agronomia (produção vegetal). Possui experiência no desenvolvimento de produtos e mercados, coordenação de equipes técnicas, consultoria agronômica e palestras técnicas. Atualmente é Agrônomo de Campo para as marcas de sementes da Corteva Agriscience™.