A Jararaca está solta?

À luz da “não-decisão” tomada na última quinta-feira pelo Supremo Tribunal Federal, postergando o julgamento do Habeas Corpus preventivo do ex-presidente Lula para o dia 04 de abril, data em que qualquer ministro do STF simplesmente pode pedir vistas do processo e estender a liberdade provisória do político condenado até as calendas gregas, fica mais fácil compreender a acidez pseudo-revolucionária da fala do ex-presidente em seu périplo mal-sucedido pelo interior gaúcho. A indignação popular de centenas de brasileiros tratou de fazer um contraponto ao clima de micareta preparado pela militância petista nas cidades de Bagé, Livramento e Santa Maria, e parece que o “excelentíssimo” não gostou. Foi quando se pronunciou, do alto do palanque, num tom muito acima do costumeiro, até mesmo pra ele, e resolveu atacar com toda fúria o produtor rural do Rio Grande do Sul.

A indecência do discurso fala por si: “Quando a gente consegue dar dez reais pra uma pessoa humilde, ela fica o resto da vida agradecido (sic). Quando você dá um bilhão para que os grandes fazendeiros daqui comprem essas maquinas modernas, comprem camioneto (sic), eles não só não são agradecidos como passa (sic) o tempo inteiro falando mal do governo do PT. Por mais que a gente financiasse a agricultura do Rio Grande do Sul, toda eleição eles se colocavam contra nós. Em 2006, Dilma, você está lembrada que eu estive aqui, as camionetas todas do último tipo, as mais modernas camionetes de fazendeiro que pegava empréstimo do governo federal. Eles tinha (sic) dois prazer na vida: um, quando ele pegava o dinheiro, e outro quando ele dava o calote no governo. Essa gente nunca gostou do PT, nunca admitiu o Olívio Dutra, nunca admitiu o Tarso (Genro). Eu fui muitas vezes em feira, aquelas feiras de criador de gado, criador de cavalo. Bom seria se eles tratasse (sic) os empregados deles igual eles tratam os cavalos deles”.

Neste discurso inacreditável, cheio de mistificações grosseiras e rancor contra o padrão de vida de alguns produtores rurais – na maioria dos casos, muito inferior ao que ele possui sem trabalhar – Lula revela sua real natureza, de político acostumado a confundir a coisa pública com bem privado. Deixa claro que, na sua opinião, produtor tinha mais é que lhe ser agradecido por permitir que os bancos financiassem a produção rural. Afinal, os humildes, como ele disse, ficam “o resto da vida agradecidos”, ou, em outras palavras, eternamente reféns da corrupção eleitoral. O Bolsa Família está aí para confirmar o repentino surto de sinceridade do ex-presidente, confirmando o que sempre foi dito a respeito deste programa: uma forma indigna de cooptar os mais pobres para sustentar seu projeto de poder.

De resto, as afirmações preconceituosas sobre o produtor rural, investem num folclore urbano, de telenovela, que trata o produtor rural como o bandido, o “Sinhozinho Malta” da história. O produtor que financia sua produção, arrisca seu patrimônio para produzir um bem que não é como a coca-cola, produzida em série, mas está sujeita ao tempo, ao clima, e principalmente, às políticas infelizes do governo. Mas bastaram alguns dias após o discurso no Rio Grande do Sul, para perceber porque Sua Excelência estava assim tão falante, com a soberba em dia, com tamanha segurança. Outras excelências, estas de toga preta, estavam providenciando para que possa continuar por aí, lépido e faceiro, agredindo as instituições e as classes produtivas do país.

Que este senhor será candidato e não será preso pelos crimes de corrupção pelos quais está condenado, isso fica cada vez mais evidente. No entanto, se seu projeto bolivariano e delirante chegar ao poder, será exclusivamente por culpa de nossa omissão. Se “a jararaca está viva”, como ele mesmo disse recentemente, a coisa que mais sabemos fazer, é cuidar de cobra quando surge na lavoura. Na lida, usa-se a pá. Na salvação das instituições, usa-se o voto e a consciência.

Tarso Francisco Pires Teixeira
Presidente do Sindicato Rural de São Gabriel
Vice Presidente da Farsul