Lideranças avaliam impactos da abertura de mercado da carne suína dos EUA para o Brasil

O ano de 2016 será lembrado como um dos piores na história da suinocultura catarinense. O alto custo de produção e a baixa remuneração paga pelo quilo do suíno massacram centenas de produtores, que desde do início do ano operam sem margem de lucro. O cenário político e econômico pelo qual o Brasil atravessa frustra qualquer expectativa de reação de preços da proteína, já que o país contabiliza mais de 12 milhões de desempregados, fator que conspira para a retração do consumo no mercado interno.

Com o atual cenário desanimador na atividade, as notícias ruins não param de surgir. A informação de que o Brasil pode importar carne suína dos Estados Unidos tem tirado o sono dos produtores de Santa Catarina, mesmo com muitas lideranças do setor afirmando que a abertura de mercado não causará grandes impactos. Conforme o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), as negociações já estão em adiantadas para que os norte-americanos se tornem exportadores para o mercado brasileiro.

O diretor-executivo do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados do Estado de Santa Catarina (Sindicarne/SC), Ricardo de Gouvêa, compartilha da ideia de que a abertura de mercado da carne suína norte-americana para o Brasil trata-se de reciprocidade, já que o Brasil está habilitado a exportar para os Estados Unidos. “Acreditamos eu eles não farão concorrência com a nossa proteína no mercado interno. Nós podemos exportar para os Estados Unidos, mas mandamos uma quantidade pequena de carne para eles. Contudo, ter o mercado aberto com os Estados Unidos é muito importante, pois comprova a qualidade da nossa proteína animal”.

Opinião da Secretaria de Estado da Agricultura 

O secretário de Estado da Agricultura e da Pesca, Moacir Sopelsa, também acredita que a carne suína dos Estados Unidos não terá competitividade no mercado brasileiro. “Nos destacamos por fazer cortes mais selecionados. Lá eles produzem carne com mais gordura, que não tem competividade no mercado nacional”.

Longo caminho

Em entrevista à Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS), o vice-presidente técnico da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Rui Vargas, pondera que o interesse dos Estados Unidos em exportar carne suína para o Brasil foi um tema que gerou muita polêmica em torno dos possíveis impactos na cadeia produtiva. “Há uma intenção dos Estados Unidos em aprovar plantas para exportar ao Brasil. O caminho é bastante longo nas questões sanitárias, avaliações das plantas e nos acordos entre os dois países. Mesmo se tendo a habilitação, a distância entre você estar aprovado e vender é bastante longa e cheia de etapas a serem cumpridas”.

Vargas cita que desde 2010 o Brasil está apto para exportar carne suína aos Estados Unidos, mas os norte-americanos não figuram sequer entre os 10 maiores clientes dos brasileiros. “Se o Brasil quiser manter a característica de pais exportador de carne suína, o Brasil precisa permitir o comércio em via dupla”.

O vice-presidente técnico da ABPA enfatiza que a preocupação do suinocultor e demais segmentos do sistema produtivo é com o aumento do consumo da carne suína no fim deste ano. “Precisamos trabalhar com o marketing da carne suína brasileira, que é de qualidade e está em um preço bom”.

Abertura de mercado preocupa a ACCS

O presidente da ACCS, Losivanio Luiz de Lorenzi, afirma que se a abertura de mercado da carne suína norte-americana para o Brasil for consolidada, Santa Catarina sentirá os impactos negativos. “Perdemos competividade devido ao alto custo de produção que o Brasil tem. Com preços mais competitivos fora do país, as grandes redes de supermercados poderão importar carne suína para abastecer suas gôndolas. Estamos preocupados e vemos que nossas lideranças políticas precisam tomar atitudes para que essa abertura não ocorra”.

A ACCS encaminhou um ofício a todas lideranças do setor para que a importação da carne suína dos Estados Unidos seja barrada. “Entendemos que o comércio precisa ser livre e é uma mão de duas vias. Precisamos que o Brasil importe outros produtos dos Estados Unidos, mas não a carne suína”.

Visão da agroindústria

Na opinião do presidente da Cooperativa Central Aurora, Mário Lanznaster, o alto preço do milho, componente que corresponde a 70% da ração animal de aves e suínos, ameaça o atual modelo produtivo em Santa Catarina. “A saca do milho posto em Chapecó custa para nós R$ 42. É vantagem produzir suínos e aves nos Estados Unidos onde o milho custa R$ 27. Se a gente fosse comparar, daria para trazer carne dos Estados Unidos. Não pensamos em fazer isso ainda, mas se analisarmos o lado econômico, não existe outra saída. As agroindústrias não conseguem repassar o custo de produção para o consumidor”.

Processo migratório da produção

A suinocultura do Sul do Brasil estará ameaçada caso produtores e agroindústrias não consigam comprar milho em preços melhores. “Se isso não acontecer o nosso negócio é ir criar suínos onde o milho é mais barato”, diz Lanznaster, citando os estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul como alternativas para a criação de suínos.

Lanznaster aponta que uma das alternativas para baratear o frete do milho seria ligar os estados produtores do cereal com as unidades federativas consumidoras através de ferrovias. “Faz mais de oito anos que se fala aos governantes sobre a necessidade de uma ferrovia, mas a situação não anda”.

O presidente da Aurora enaltece a mão-de-obra de Santa Catarina, mas reitera que o alto custo de produção pode alterar a dinâmica produtiva na suinocultura. “Não se investe mais aqui no Sul. Apenas complementamos algumas unidades, o forte do investimento não vai ser aqui. O governo já disse para nós que não está com vontade de montar a ferrovia. Nós temos duas saídas: ou produzimos suínos no Brasil central ou trazemos carne suína dos Estados Unidos, onde o milho é mais barato”, revela o presidente da Aurora.

Relação Rússia x Brasil

O presidente da Cooperativa Central Aurora prevê que a Rússia, principal compradora de carne suína brasileira, pode diminuir o volume de importação por causa de acordos comerciais firmados, mas que não foram cumpridos. “Há quatro ou cinco meses a ex-ministra Kátia Abreu foi para a Rússia e se comprometeu em importar trigo e peixe da Rússia para o Brasil. Em contrapartida, eles comprariam carne suína brasileira. O Brasil não comprou trigo e nem peixe da Rússia. A Rússia já está contando alguns frigoríficos do Brasil”, explica Lanznaster.

Fonte: ACCS