Milho pipoca atrai produtores que buscam maior renda e diversificação de culturas

Quem vê uma lavoura de milho pipoca e uma plantação de milho convencional pode achar que elas vão produzir o mesmo cereal. Além de serem visualmente parecidas, há orientações de manejo em comum nas duas culturas. As semelhanças podem atrair produtores de milho convencional que desejam fugir dos preços baixos, diversificar os negócios e apostar em um cultivo mais rentável.

O principal motivo para apostar na pipoca está na remuneração. Uma saca de 60 quilos de milho pipoca custa R$ 45 no Mato Grosso, valor superior ao do milho convencional. No entanto, antes de se aventurar no mercado da pipoca, o produtor deve estar ciente de que o cultivo desse milho exige manejo mais cuidadoso e o segmento também tem percalços. “Um bom produtor de milho [comum] seria um bom produtor de pipoca”, afirma Sergio Stefanelo, que cultiva pipoca em Campo Novo do Parecis (MT), um forte polo de produção. Mas, ele acredita que nem todo produtor é capaz de ter sucesso com essa cultura. “Ela é mais exigente”, diz Stefanelo.

Tecnologia do milho pipoca

Para Eduardo Sawazaki, pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), a maior diferença que um produtor de milho deve enfrentar ao trocar de cultura é a maior demanda por tecnologia. “O produtor que vai plantar milho pipoca precisa ter uma colheitadeira muito boa, tipo axial, e um secador de fogo indireto”, diz Sawazaki. A falta desses equipamentos pode interferir no resultado do produto final.  “A pipoca pode perder até 20% da qualidade dependendo da colheita e do secador.”

Para quem pensa em migrar para a cultura, a orientação do especialista é buscar uma parceria com a indústria. As vantagens de ter esse suporte estão no recebimento de sementes de qualidade, comercialização garantida e beneficiamento de qualidade.

Custo e produtividade

Na Fazenda São Carlos, Stefanelo plantou 4.000 hectares de milho pipoca na segunda safra 2016/2017. O custo de produção ficou na casa dos R$ 2.000 por hectare, enquanto que o cultivo de milho convencional na região custa de R$ 1.400 a R$ 1.600 por hectare. “O milho [convencional] tem um custo de semente mais alto. Mas, em compensação, a pipoca tem mais custo com fungicida e inseticida”, conta o produtor.

Nesta safra, alguns talhões renderam 90 sacas por hectare, mas a média de produtividade na Fazenda São Carlos foi de 65 sacas por hectare. “Foi um ano de produtividade média”, diz. Segundo o produtor, as lavouras de milho pipoca já chegaram a render até 100 sacas por hectare na propriedade.

Mais de 50 clientes compram o milho pipoca produzido na Fazenda São Carlos. “Eu colho, trago para o silo, beneficio os grãos e coloco em sacos de 25 a 50 quilos”, conta Stefanelo. “Depois eu vendo para as empresas que empacotam e botam a sua marca.”

A colheita ocorre entre maio e junho e a fazenda tem capacidade para armazenar 25 mil toneladas do produto. “A gente colhe durante um mês e vende durante 12 meses”, diz o produtor. Normalmente, o quilo do milho pipoca chega até São Paulo custando de R$ 1,45 a R$ 1,50, somando frete, impostos e beneficiamento. De acordo com Stefanelo, o produtor recebe de R$ 0,72 a R$ 0,75 por quilo.

O drama da semente

A maioria da semente de milho pipoca semeada no Brasil é importada dos Estados Unidos e da Argentina, o que eleva os custos de produção. Ainda assim, as sementes importadas de milho pipoca são mais baratas do que as sementes de milho convencional porque não são transgênicas.

Segundo o produtor, a semente importada tem qualidade muito superior quando comparada com as nacionais. Stefanelo cultivou duas variedades argentinas: uma da empresa Basso, que ocupou 25% da área, e outra da Seedco, semeada em 40% da lavoura. Além disso, o produtor usou a semente norte-americana da Alumni, em 35% da área plantada com a cultura.

No momento de escolher uma boa semente, as características que os produtores buscam para alcançar boa produtividade aliada à qualidade do produto são grão graúdo, expansão alta e amarelo intenso.

Segundo o pesquisador do IAC, quanto maior a expansão, maior a qualidade do produto.  O mercado procura grãos com expansão acima de 40 mililitros por grama. Em relação à coloração, os grãos variam de branco ao amarelo mais intenso. Embora a cor não tenha impacto na produção ou na qualidade, existe a preferência dos consumidores pelos grãos no tom amarelo mais escuro. “Tem muito material produzindo até 100 sacas por hectare, coisa que era difícil no passado”, diz o pesquisador. “Houve um ganho de produtividade dos novos híbridos, a produção por planta quase que dobrou.”

Esforço nacional

Para que o Brasil não seja tão dependente das sementes importadas, há um esforço por parte de institutos de pesquisa como o Instituto Agronômico de Campinas (IAC), vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, que desenvolve híbridos de milho pipoca.

Recentemente foram lançados os híbridos IAC 367 e IAC 268, que já estão disponíveis para os produtores interessados. Uma das vantagens é que essas variedades são adaptadas para o plantio de verão na região do estado de São Paulo e podem diversificar a produção da cultura, que ainda está concentrada no Centro-Oeste e na segunda safra.

Gargalos da pipoca brasileira

De acordo com Eduardo Sawazaki, pesquisador do IAC, a indústria privilegia as sementes importadas. Então, como falta parceria com essas empresas, as sementeiras nacionais se sentem desestimuladas.

Esse é um grande gargalo que emperra o investimento no desenvolvimento de híbridos nacionais de milho pipoca, segundo o pesquisador. “As indústrias que são as grandes importadoras de sementes preferem híbridos americanos devido à melhor qualidade da pipoca. Esses híbridos têm mostrado boa adaptação no Rio Grande do Sul e no plantio safrinha no Mato Grosso”, diz Sawazaki.

Por essa razão, poucas empresas produzem sementes de milho pipoca no Brasil, entre elas a Sellas, Agristar e o próprio IAC. Outra explicação para a escassez de sementes nacionais é a dificuldade de competir com a qualidade das sementes produzidas nos Estados Unidos, que é o maior produtor de pipoca do mundo. “O Brasil deixou de ser um grande importador de grãos de milho pipoca, para ser talvez o maior importador de sementes de milho pipoca”, diz Sawazaki.

Se conseguir híbridos nacionais já é uma tarefa difícil, a produção de milho pipoca transgênico é um sonho distante. De acordo com Sawazaki, a semente de milho pipoca já é muito cara por causa da baixa produtividade dos campos de  sementes. Dessa forma, o alto investimento em pesquisa para desenvolver sementes transgênicas tornaria esse mercado inviável. Além disso, o alimento é consumido sem processamento e, como a transgenia ainda é um tema polêmico, uma pipoca transgênica poderia afastar muitos consumidores.

Manejo de pragas e doenças

Além de exigente, a cultura do milho pipoca é mais sensível e tem custo de produção maior. Embora as doenças e as pragas sejam as mesmas nas duas culturas de milho, a lavoura de milho pipoca acaba sofrendo danos maiores. “As pragas com que o produtor mais se preocupa hoje em dia são o percevejo, lagarta-do-cartucho e a lagarta-da-espiga”, conta Sawazaki.

Por não existir a opção de milho pipoca transgênico, a cultura exige mais aplicações de fungicidas e inseticidas. “No milho [convencional] você aplica uma vez, na pipoca pode chegar a aplicar cinco ou seis vezes”, afirma o produtor.

Logística difícil

Os agricultores de Mato Grosso enfrentam dificuldades para escoar a produção agrícola. Campo Novo do Parecis, por exemplo, fica a mais de 1.700 quilômetros do Porto de Santarém (PA), 1.057 quilômetros distante do Porto de Porto Velho (RO) e a quase 2.500 quilômetros do Porto de Itajaí (SC). “Estamos longe dos centros consumidores, mas por ter uma logística muito ruim a gente ganha com produtos de valor agregado”, diz Stefanelo.

Para o produtor, a conta é simples. Quando o valor da saca de milho vale 2 a 2,2 vezes mais que o preço da saca de milho convencional, o cultivo da pipoca é vantajoso. Ou seja, se o milho está custando R$20, a pipoca é viável com preço de venda a partir de R$ 40 por saca.

Um dos grandes aliados dos produtores de Campo Novo do Parecis (MT) é o clima da região. Enquanto em outros estados, como Goiás e Rio Grande do Sul, que também produzem pipoca o clima é bastante irregular, no município mato-grossense a regularidade é a chave para o sucesso. Segundo Stefanelo, eles sempre têm sete meses de chuva e cinco meses de seca, o que beneficia o desenvolvimento final e a colheita, já que a pipoca pode alcançar o nível de umidade ideal ainda no campo.

Pipoca é um mistério

Embora o cultivo tenha avançado no país nos últimos anos, quantificar a produção brasileira de milho pipoca ainda é um desafio. As principais entidades do setor, como a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que acompanham a safra de grãos, não fazem levantamentos sobre o milho pipoca e acabam contabilizando esse segmento do mercado junto com a primeira e a segunda safra do cereal convencional.

Ter acesso ao volume de milho pipoca para semeadura que entra no Brasil é outro desafio. Nem mesmo o sistema do Ministério da Indústria, Comércio e Exterior apresenta os dados da importação de sementes de milho pipoca, já que só estão disponíveis informações sobre o milho convencional e o milho doce. Por isso, os dados sobre esse nicho do mercado de milho ainda vêm dos profissionais que atuam na área e não de órgãos oficiais.

A expansão da pipoca

Em regiões mais próximas dos centros consumidores, a saca pode chegar a valer R$ 90. A tendência é que haja uma expansão do cultivo de milho pipoca em várias regiões produtoras, como forma de diversificação de culturas e garantia de melhor remuneração ao produtor.

Entre as iniciativas que estimulam a expansão do segmento está o trabalho da empresa Boom do Brasil. A empresa de secagem e beneficiamento móvel de grãos, de Formosa (GO), começou neste ano a fomentar a produção de milho pipoca em estados mais próximos dos centros consumidores como São Paulo, Goiás, Minas Gerais, Distrito Federal e Bahia.

De acordo com Márcio Baioto, diretor-administrativo da Boom do Brasil,  aproximadamente quinze produtores já estão envolvidos no projeto. “Eu faço toda a logística de contratos com o produtor desde o plantio até a entrega para a indústria”, diz Baioto. “As áreas irrigadas podem fornecer milho pipoca o ano inteiro. A demanda da indústria é imensa, tem mercado nacional e para exportação.”

Ele explica que o agricultor e a indústria fecham o contrato, definem valores e a entrega dos grãos enquanto que a Boom do Brasil fica com a missão de acompanhar a produção e garantir a qualidade dos grãos a partir do controle da umidade e da classificação.

Preço em alta

Em regiões mais próximas dos centros consumidores, dependendo da época do ano, a saca de milho pipoca pode variar entre R$ 60 e R$ 90. “Custa de duas a três vezes o saco de milho [convencional]”, afirma o diretor-administrativo. Além disso, ele avalia que o custo de produção do milho pipoca é de cerca de 70% o do milho.

Uma das vantagens desse setor, segundo Baioto, é o fato de ser um mercado que agrega valor ao produto. “A pipoca pode chegar ao mercado final com valor quase 100 vezes mais do que é pago ao produtor”, diz o diretor. “Os preços podem ser melhorados para o produtor, porque ele fica com a menor fatia do lucro.”

Para apostar nesse mercado, no entanto, os produtores interessados precisam ter acesso a mais informações sobre o cultivo, tecnologias para o manejo e como comercializar o produto. De acordo com Baioto, existem dúvidas sobre condições básicas como produtividade, preço de mercado e compradores que emperram o avanço do setor.

Fonte:  SFAGRO