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O Brasil agrícola em contramão positiva

Acaba de ser lançado o relatório Perspectivas Agrícolas 2015-2024, elaborado conjuntamente pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Trata-se de uma publicação que se consolidou, nos últimos anos, como referência sobre as perspectivas e desafios da agricultura no mundo. A economia mundial completa sete anos imersa no mais lento, desigual e excludente processo de recuperação de todas as grandes crises internacionais, desde 1929. O cenário específico da agricultura, em 2015, não destoa da dinâmica global de contenção e incerteza, mas enseja preocupações próprias.

Em termos reais, os preços agrícolas devem registrar queda generalizada na próxima década. Ademais da conjuntura mundial adversa, pesa aí a determinação exercida pela secular curva de declínio das cotações, consequência da prevalência estrutural da produção sobre a curva da demanda. Avanços tecnológicos e ganhos de produtividade permitirão aumento na produção mundial de 18%, nos próximos 10 anos. Também prevê-se elevação significativa da demanda por alimentos em países em desenvolvimento, devido ao crescimento populacional, maior renda e urbanização. Esse crescimento virá, porém, acompanhado de uma marcada desaceleração da demanda em alguns mercados, sobretudo na China.

Estamos longe, de qualquer forma, de um horizonte de depressão nas cotações internacionais: a previsão conjunta da FAO e da OCDE é de que os preços das commodities agrícolas, embora desprovidos de impulsos ascendentes, devem oscilar em um patamar superior à média registrada antes do pico de 2007/2008. A edição de 2015 do relatório é especial, por trazer um capítulo sobre o Brasil, dando sequência a edições dedicadas à China, em 2013, e à Índia, em 2014. A publicação foi lançada em Paris, em 1° de julho. Em Brasília, o lançamento será lançada no Escritório da FAO, na quarta-feira. O capítulo dedicado ao Brasil está traduzido para o português (www.fao.org.br).

De acordo com o estudo, o Brasil reúne credenciais para percorrer os próximos anos com menor vulnerabilidade e maior eficiência. O país será beneficiado por uma maior demanda interna e externa por produtos nos quais é competitivo; em especial, carne, milho, soja, açúcar e frutas tropicais. Esse crescimento trará oportunidades para a agricultura comercial e para os agricultores familiares, em produtos nos quais as economias de escala são menos evidentes, notadamente café, frutas e hortaliças.

Como resultado, a agricultura continuará desempenhando um papel importante em termos de emprego, geração de renda e rendimentos de exportação. Rendas maiores para agricultores familiares e suprimentos abundantes de diversos alimentos também contribuirão para mais melhorias na segurança alimentar e nutrição. Assim, o Brasil seguirá se fortalecendo como um dos principais players globais no mercado de commodities agrícolas. Ampliará sua participação no comércio internacional, num momento em que o peso dos subsídios, ainda relevante em seus concorrentes, tornou-se insustentável.

O relatório mostra ainda que o país, já hoje segundo maior fornecedor mundial de alimentos, está preparado para essa escalada. Além da contínua inovação tecnológica, é uma das poucas fronteiras agrícolas onde é possível a ampliação de área sem novas derrubadas de florestas, graças à recuperação de pastagens degradadas e à maior integração dos sistemas de produção agrícola e pecuária. O capítulo Brasil do relatório conclui: “Os benefícios do crescimento sustentável na agricultura do Brasil são vastos. Simultaneamente, melhoram a disponibilidade de alimentos tanto para os consumidores internos como os internacionais, enquanto geram oportunidades para diversos agricultores. Esses ganhos são plenamente compatíveis com a ênfase do governo na redução da pobreza e na desigualdade de renda e, simultaneamente, na melhoria da sustentabilidade ambiental do setor agrícola”.

A singularidade brasileira reside sobretudo no delicado equilíbrio conquistado entre o agronegócio, o resgate e a crescente importância da agricultura familiar, e a vitória contra a fome, em apenas uma década de políticas ativas de segurança alimentar. O grande desafio brasileiro, agora, é saber explorar seus trunfos nas frentes internacional, produtiva e social, saindo na frente rumo a sistemas agrícolas compatíveis com o uso sustentável dos recursos naturais.

*José Graziano da Silva é Diretor-geral da FAO. Artigo publicado no Correio Braziliense

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