Plantas daninhas – 9 fatos primordiais para o manejo de plantas daninhas resistentes ao glifosato

Por Jessica Scarpin

Nos últimos 10 anos todos nós observamos o surgimento de ervas daninhas resistentes a glifosato e a diversos herbicidas.

Estima-se a resistência de plantas daninhas no Brasil custa impressionantes 9 bilhões de reais. Esse número mostra a importância de se realizar um controle bem feito de ervas daninhas.

E com o surgimento da resistência, surgem também outras maneiras de controle, que podem ser a chave para uma alta produtividade. Veja a seguir as principais maneiras de como manejar sua lavoura quando aparecem ervas daninhas resistentes a glifosato.

1.Como surge uma planta resistente ao glifosato ou outros herbicidas

As ervas daninhas, evolutivamente, já apresentam uma variabilidade genética natural. Ou seja, dentro de uma mesma espécie de plantas daninhas há diferenças genéticas entre cada indivíduo.

Os herbicidas selecionam aqueles indivíduos que apresentam genes que resultam em resistência. Portanto, aplicações de herbicidas não criam um indivíduo resistente, apenas selecionam. E essa seleção não é de um dia para outro.

A seleção de biótipos resistentes ocorre através da aplicação de um mesmo herbicida repetidas vezes na mesma área. Como, por exemplo, nas culturas transgênicas resistentes ao glifosato, onde muitos só aplicam esse herbicida durante toda a cultura, e em muitas safras.

Sendo assim, este indivíduo selecionado morre após a aplicação do produto e produz sementes, ocupando mais facilmente a área que antes era ocupada, em sua maioria, por plantas suscetíveis.

Por isso, o uso massivo de somente um tipo de herbicida auxilia no desenvolvimento da resistência na sua propriedade, seja em lavouras de soja ou qualquer outra cultura. A figura abaixo ilustra facilmente como isto pode acontecer.

    (Fonte: Christoffoleti e López-Ovejero (2008) em Monsanto)

Podemos dizer que uma área apresenta resistência, quando controla-se menos de 80% das espécies, apresentando 30% de plantas sobreviventes. Vamos ver agora as principais ervas daninhas resistentes em nosso país, para você ficar de olho nelas na sua fazenda:

  1. Principais ervas daninhas resistentes ao glifosato

No Brasil, foram identificados biótipos resistentes das seguintes espécies:

  • Buva (Conyza bonariensisConyza canadensis e Conyza sumatrensis)
  • Azevém (Lolium multiflorum)
  • Capim-amargoso (Digitaria insularis)
  • Capim-branco (Chloris elata)
  • Capim-pé-de-galinha (Eleusine indica)
  • Caruru palmeri (Amaranthus palmeri)

Entender a biologia destas ervas daninhas é muito importante para manejá-las e saber qual ferramenta é a mais eficaz. Por exemplo, a buva é uma planta fotoblástica positiva, o que significa que só germina na presença de luz. Sendo assim, o uso de palhada no solo, pode ser uma alternativa efetiva ao uso de herbicidas.

O caruru palmeri é um dos maiores problemas da cultura do algodoeiro nos EUA. Foi relatado sua presença no estado do Mato Grosso em 2015. O problema relacionados à esta planta, está na velocidade do crescimento, atingindo2 a 3 centímetros por dia, além da alta produtividade de sementes. A suspeita é de que as sementes tenham vindo junto com máquinas agrícolas que vieram importadas dos EUA, portanto já contendo os genes de resistência. Isso mostra a importância do bom planejamento agrícola e limpeza de máquinas.

Os folders a seguir, foram publicações do HRAC-BR, nos quais você irá visualizar e entender melhor sobre características importantes das espécies resistentes ao glifosato. Os folders abordam os seguintes temas:

  • Diferenciação das espécies de buva;
  • Identificação do Amaranthus plameri e outras plantas do gênero Amaranthus;
  • A problemática do capim-amargoso.

 Acredito que este seja um documento importante para consulta, nos momentos de dúvida dessas espécies na sua lavoura.

  1. Principais plantas daninhas resistentes importantes no Brasil resistentes a outros herbicidas

A espécies Bidens pilosa (picão preto) e Euphorbia heterophylla (leiteiro ou amendoim-bravo), foram as primeiras espécies relatadas com casos de resistência no Brasil, em 1993.

Essas espécies apresentam resistência aos herbicidas inibidores da enzima ALS (como chlorimuron ethyl, halosulfuron, nicosulfuron, dentre outros). Existe uma organização internacional, envolvendo 80 países, responsável por discutir e gerar novas alternativas de manejo.Esta organização se chama “Internacional Survey of Herbicide Resistant Weeds”.

Sempre que um novo caso de resistência é comprovado, pesquisadores e especialistas da área o adicionam no site, obtendo um banco de dados a nível mundial. No site da organização, consta que no Brasil há 48 casos de resistência, o ano em que foi descoberto esses biótipos resistentes e a quais os mecanismos de ação.

Você pode ver que muitos apresentam resistência múltipla, quando são resistentes a mais de um mecanismo de ação. Por exemplo, buva resistente ao glifosato e a inibidores da ALS.

O site está em inglês mas na listagem aparecem os nomes científicos e os mecanismos de ações que você pode traduzir facilmente por aplicativos tradutores. Por existirem esses casos, você deve ficar mais atento a variar na escolha quais herbicidas você deve aplicar.

Além do site ser super informativo, a observação do que está acontecendo no Brasil e no mundo com certeza vai te ajudar a tomar decisões melhores dentro da sua porteira.

  1. Como controlar eficientemente as plantas daninhas resistentes ao glifosato

Para realização de um manejo sustentável, é preciso fazer mais que apenas o controle. A prevenção é importantíssima para evitar, ao máximo, o surgimento de espécies resistentes na sua propriedade. Dessa forma, é necessário reduzir a pressão de seleção na população por meio de práticas do manejo integrado de plantas daninhas:

(Fonte: Fórum sobre manejo de resistência de ervas daninhas a herbicidas)

Você pode adotar técnicas culturais e mecânicas, além do manejo químico, para atingir alta eficácia no controle da sua área. Dentre as técnicas culturais, as principais para o manejo de invasoras são:

  • Diminuição do período de pousio ou fazer cultura de cobertura ao invés do pousio;
  • Investimento na palhada para cobertura do solo;
  • Uso de cultivares adaptadas a menores espaçamentos na entrelinha;

5.Manejo químico de plantas resistentes ao glifosato e outros herbicidas

A seguir citarei alguns produtos e práticas que podem ser utilizados no seu sistema de produção para o manejo de ervas daninhas resistentes ao glifosato e outros herbicidas no Brasil.

A primeira etapa para um bom manejo de ervas daninhas é realizar a dessecação da sua área antes do plantio. Para esta etapa você pode utilizar o glifosato associado com outro herbicida para controlar as plantas tolerantes e resistentes.

Pode-se fazer a associação de herbicida residual, possibilitando aplicações mais espaçadas no tempo. Para controle de plantas entouceiradas, pode-se utilizar produtos como paraquat, diquat ou glufosinato de amônio, que são herbicidas de contato.

Para o controle de gramíneas, são indicados os inibidores da ACCase, como haloxyfop-methyl, clethodim, fenoxaprop-p-ethyl e outros. Caso as espécies de gramíneas sejam resistentes a este mecanismo, o uso de glifosato e glufosinato de amônio são alternativas.

Já para ervas daninhas de folhas largas, o 2,4D é um dos herbicidas mais utilizados. Se atente para o fato de que cada cultura apresenta um nível de tolerância para esses herbicidas. Por isso, a consulta de engenheiro(a) agrônomo(a) é fundamental para a correta utilização desses produtos.

(Fonte: Fórum sobre manejo de resistência de ervas daninhas a herbicidas)

6.Falha no controle nem sempre significa ervas daninhas resistentes

Nem sempre o escape de plantas após aplicação de herbicidas, significa que a sua área está infestada com ervas daninhas resistentes.  Esta figura abaixo ilustra bem o que quero dizer:

  (Fonte: Take Action on Weeds, traduzido por AEGRO)

Assim, é preciso eliminar diversas outras causas antes de considerar a resistência, como:

  • Tecnologia de aplicação do herbicida
  1. Dose inadequada;
  2. Baixa cobertura do alvo ou incorporação insuficiente;
  3. Momento de aplicação inadequado (estádio da planta daninha);
  4. Necessidade de adjuvante;
  5. Excesso de poeira na folha ou água de baixa qualidade na calda;
  6. Efeito “guarda-chuva” nas aplicações em pós-emergência;
  7. Antagonismo entre dois ou mais herbicidas no tanque de pulverização.
  • Solo ou condições climáticas
  1. Umidade excessiva ou solo seco;
  2. Condições de preparo do solo no momento de aplicação;
  3. Adsorção dos herbicidas no solo e na matéria orgânica;
  4. Condições de estresse;
  5. Período sem chuva após a aplicação para ativação do herbicida.
  6. Qual o impacto econômico causado pelo surgimento da resistência?

Eu acho muito mais fácil entender o porquê de controlar as ervas daninhas resistente, quando vejo o impacto que isso causa, economicamente. Até se você for procurar matérias sobre o assunto na internet, é muito mais fácil encontrar boletins técnicos sobre mecanismo de resistência, manejo, por exemplo.

Percebendo isso, a EMBRAPA publicou um circular técnico, em 2017, de extrema importância, que faz uma análise geral econômica a nível nacional. E isso é importante pois você percebe que: o que foi feito no passado (ou o que não foi feito), está tendo um grande impacto hoje.

Por exemplo, o aumento de custo para controle de ervas daninhas em uma área com problema de resistência para uma área “suscetível”, pode variar entre 40% para 200%. A variação aumenta conforme há mais de uma espécie resistente.

O documento aborda principalmente áreas de produção de cultura da soja em todo o Brasil e aponta como as principais espécies de ervas daninhas o azevém, a buva e o capim amargoso.

Além disso, retorno a enfatizar que o manejo integrado pode nos ajudar a diminuir os custos com resistência. Nesta matéria mostra alguns produtores do Paraná que investem no manejo integrado.

Ao plantarem braquiária em sucessão ao milho, conseguiram economizar R$138,00 por hectare, por diminuir no uso defensivos, na safra de soja. Por isso a importância de conhecer o custo do manejo de plantas daninhas por hectare e da sua fazenda como um todo. Só assim você saberá o que está compensando fazer, e qual é a melhor medida de controle em termos produtivos e financeiros.

8.Termos importantes para entender ervas daninhas resistentes ao glifosato e outros herbicidas

Plantas suscetíveis aos herbicidas

A suscetibilidade de uma certa de planta daninha é uma característica natural de cada espécie. É a mortalidade ou danos que ocorrem em uma planta após a aplicação do herbicida, resultado da incapacidade de suportar a ação do produto.

Plantas tolerantes aos herbicidas

Plantas tolerantes apresentam naturalmente a característica de sobreviver e se reproduzir, mesmo após a aplicação de um herbicida na dose recomendada, desde a primeira aplicação.

Por exemplo: 2,4-D controla plantas de caruru (Amaranthus spp.) mas não controla capim-colchão (Digitaria ciliaris), pois esta espécie é tolerante a este herbicida.

E o que são plantas resistentes aos herbicidas?

Ervas daninhas resistentes são aquelas que anteriormente eram suscetíveis ao herbicida em questão, mas agora conseguem sobreviver e completarem seu ciclo de vida após a aplicação deste produto.

Para que essa ervas daninhas sejam realmente tidas como resistentes, a aplicação do herbicida deve ser na dose recomendada e em condições de campo. Assim, temos a seleção de biótipos resistentes. Aliás esse é o termo academicamente correto quando falamos nesse assunto.

Esse termo é definidocomo um grupo de indivíduos com genética semelhante, porém pouco diferenciado da maioria dos indivíduos da população. Ou seja, dentro de uma mesma espécie com genética semelhante, alguns grupos de indivíduos possuem diferenças.

No caso das ervas daninhas, a caracterização genética é feita apenas pela diferenciação em plantas resistentes e suscetíveis. Se na sua propriedade apareceram plantas de capim amargoso resistentes ao glifosato, por exemplo, isso quer dizer que houve seleção de biótipos resistentes.

  1. Associação Brasileira de Ação a Resistência de Plantas Daninhas aos Herbicidas: HRAC

Você não está sozinho no combate às ervas daninhas resistentes. O HRAC-Brasil é a Associação Brasileira de Ação a Resistência de ervas daninhas aos Herbicidas, fundada no ano 2000. Esta Associação é um grupo formado por especialistas ligados à indústria química, atualmente composta por 15 empresas registradas.

A missão do HRAC é promover o gerenciamento e acompanhamento de casos de resistência de ervas daninhas aos herbicidas. O HRAC atua no entendimento, cooperação técnica, educação, informação e comunicação entre as indústrias, pesquisadores, governo, órgãos de pesquisa, universidade e produtor brasileiro.

Tudo isto com o objetivo de promover o manejo sustentável das ervas daninhas e o ciclo de vida dos herbicidas. O HRAC-BR promove eventos, faz folders (como já citei no começo do texto) explicativos sobre as novas espécies de plantas resistentes que surgem e livros explicativos.

Indico para você a leitura do livro “Aspecto de resistência de ervas daninhas a herbicidas”. Diversas informações colocadas aqui neste texto foram retiradas deste livro, que explica de modo simples e fácil de entender os principais assuntos quanto ao manejo de ervas daninhas resistentes aos herbicidas.

   (Fonte: HRAC)

 Conclusão

 Ervas daninhas resistência a glifosato é um grande problema na agricultura brasileira pelo impacto financeiro que isso causa para todos os agricultores e para a cadeia.

E é por isso que as questões levantadas neste texto são importantes para seu processo produtivo, entendendo o que é a resistência e como manejá-la adequadamente. Aqui você viu diversos conceitos sobre o tema e as principais dicas para fazer de como fazer esse manejo eficiente.

Também vale ressaltar que, no final das contas, os custo do manejo e sua produção final são essenciais para definir qual a melhor maneira de fazer seu controle de plantas daninhas.

Jessica Scarpin é Engenheira Agrônoma formada na ESALQ-USP, com experiência em pesquisa de campo, grandes culturas e fruticultura.

Fonte: http://www.aegro.com.br