Anti-inflamatória em planta da caatinga

Pesquisadores encontram compostos com atividade anti-inflamatória em planta da caatinga

Um tipo de açucena nativa da Caatinga mostrou-se rica em substâncias com atividade anti-inflamatória. A planta foi cultivada e caracterizada quimicamente por pesquisadores da  Embrapa Agroindústria Tropical (CE) e da Universidade Federal do Ceará (UFC), que buscam alternativas para agregar valor à biodiversidade. Coletada nas cidades de Pacatuba e Moraújo, no Ceará, a Hippeastrum elegans é conhecida popularmente como lírio, tulipa, cebola-do-mato, cebola-berrante, flor-da-imperatriz e, principalmente, açucena.

Já havia registros científicos sobre a presença de substâncias de interesse farmacológico na variedade. A família dessas plantas, a Amaryllidaceae, é reconhecida por apresentar compostos com utilidade farmacêutica, os alcaloides (saiba mais sobre essas substâncias no quadro abaixo).  No caso da espécie encontrada no Ceará, os pesquisadores monitoraram quatro diferentes alcaloides ao longo de 15 meses de cultivo: sanguinina, narciclasina, pseudolicorina e galantamina.

Esse tipo de açucena não possui registro de uso etnobotânico relevante como planta medicinal ou ornamental. Porém a descoberta de alcaloides bioativos pode direcioná-la para possíveis aplicações farmacêuticas, agregando valor à planta. “Como é nativa da Caatinga, é naturalmente bem-adaptada às condições climáticas da Região Nordeste”, acrescenta o pesquisador da Embrapa Kirley Canuto, coordenador dos estudos.

Para domesticar a planta, determinar a composição química e avaliar suas propriedades farmacológicas segundo a época de colheita, foi realizado um projeto de pesquisa que envolveu agrônomos, químicos, biomédicos e farmacêuticos.

O estudo conduzido pela Embrapa verificou que a composição química dos bulbos de açucena variou dependendo da época de colheita, impactando suas atividades farmacológicas. Ao fim da avaliação química, observou-se, ainda, que a açucena apresentava grande quantidade de narciclasina, um bem documentado agente anticâncer segundo relatos científicos anteriores, mas com considerável toxicidade, o que limita sua aplicação clínica.

A professora Luzia Kalyne Almeida Moreira Leal, do Centro de Estudos Farmacêuticos e Cosméticos do curso de Farmácia da Universidade Federal do Ceará (Cefac/UFC), explica que a atividade anti-inflamatória foi comprovada em células de defesa do sangue humano (neutrófilos) e do sistema nervoso central de roedores (micróglias). O extrato foi capaz de diminuir a ativação celular e a secreção de mediadores inflamatórios, sem causar citotoxidade.

Primeiro o extrato de açucena foi testado em neutrófilos humanos, que são as primeiras células de defesa ativadas no sistema imune. A super ativação dessas células está associada a diversas doenças importantes, como asma severa, artrite reumatoide e Covid-19. Por esse motivo, estudos que buscam sanar essas enfermidades têm como alvo moléculas que atuem no controle da ativação excessiva dos neutrófilos. Leal salienta que como foram usadas células humanas, há boas chances de os resultados se confirmarem em outras fases dos estudos.

Os testes realizados com células do sistema nervoso central, as micróglias, também foram positivos. As frações de alcaloides de açucena testadas foram capazes de reduzir a neuroinflamação induzida nas células microgliais. Doenças como mal de Alzheimer e mal de Parkinson envolvem inflamação do sistema nervoso central. O próximo passo será testar substâncias isoladas da planta.

Fonte: Embrapa