A boa demanda da China

A China deve ultrapassar os Estados Unidos (EUA) como a maior economia mundial em 2027, segundo estimativa do banco J.P. Morgan. Estudo da companhia aponta o potencial do país asiático em dobrar a renda per capita de sua população na próxima década, passando de US$ 10 mil para US$ 20 mil, o que, segundo o levantamento, qualificaria a China como um país de alta renda. Nesse mesmo período, a expectativa é que meio bilhão de chineses devem ingressar na classe média. Confirmada essas projeções, a perspectiva é de maior demanda para o agronegócio goiano, com possibilidade de diversificação dos itens embarcados.

“Goiás sai favorecido por ser um dos maiores produtores do Brasil”, avalia o mestre em Agribusiness, economista Marcus Antônio Teodoro Batista. Ele cita ser esperado que “todas commodities vão ganhar terreno”. “É o caso da soja, milho, algodão, café, na pecuária, o boi de corte, então, de forma geral, isso para o Estado é muito bom”, diz. De acordo com dados da Radiografia do Agro, publicação do governo goiano, por meio da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa), Goiás possui o segundo maior rebanho de bovinos do País, é o terceiro maior produtor nacional de soja e milho; e ainda ocupa a quarta posição na produção de algodão e a sétima, na de café arábica. Batista destaca que, hoje, a China já é o maior importador dos produtos goianos e, diante da estimativa da economia do país asiático dobrar nos próximos anos, a tendência é que o Estado exporte mais, e não só grãos.

A expectativa é compartilhada pelo coordenador institucional do Instituto para o Fortalecimento da Agropecuária de Goiás (Ifag), Leonardo Machado. Ele frisa que a China já compra muita soja, mas ante ao incremento projetado, deverá ampliar também a demanda por proteína animal e produtos mais elaborados. “Porque a partir do momento que começam a ter um crescimento de renda, eles começam a ter um maior consumo de produtos mais elaborados, mais caros”.

Machado cita que um exemplo que já se vê é o da carne bovina. “A demanda que eles estão começando a ter por carne bovina é algo surpreendente, consumindo muito pouco por habitante, mas cada vez mais crescendo esses números. Então, isso significa um desafio muito grande que é alimentar toda essa demanda, é ter oferta para atendê-la”.

A edição de agosto da Carta Brasil-China, publicação do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), destaca que, em 2016, a proteína animal respondia por 8% das exportações brasileiras do agronegócio para o país asiático, e que, em 2020, esse percentual foi de 19%.

Em valor, as exportações brasileiras como um todo para a China quase dobraram nesse período. Saltaram de US$ 35,133 bilhões em 2016, para US$ 67,788 bilhões, segundo dados do Ministério da Economia/Sistema ComexStat, divulgados via Secretaria de Indústria, Comércio e Serviços de Goiás (SIC). Documento elaborado pela SIC, também tendo como fonte as informações do Ministério da Economia, mostra evolução semelhante no resultado das vendas externas de Goiás para China. O montante mais que dobrou no período, saindo de US$ 1,428 bilhão em 2016 para US$ 3,564 bilhões em 2020, o equivalente a um crescimento de quase 150%.

Em 2021, de janeiro a julho, 48,61% das exportações goianas tiveram como destino a China, o equivalente a US$ 2,739 bilhões. No topo da lista dos produtos de Goiás exportados para o país asiático nesse período estão soja, com 4,852 milhões de toneladas, apresentando valor de US$ 2,019 bilhões, seguida pelas carnes desossadas de bovino, congeladas, com 89,7 mil toneladas, representando US$ 467,7 milhões.

No quesito importação, nos primeiros sete meses deste ano, a China foi o segundo país que mais vendeu para o Estado, o equivalente a US$ 409,8 milhões, que rendeu uma participação de 14,95% no total importado por Goiás no período.

Diversificação da pauta é desafio

Consultor de mercado da Pátria Agronegócios, Cristiano Palavro ressalta que o crescimento chinês está diretamente ligado à necessidade de maiores compras de commodities, que são a maior parte dos produtos que os chineses importam do Brasil. “Então é natural que a gente siga com crescimento nesses setores”, analisa. Ele observa, porém, que o grande desafio que Goiás e o Brasil como um todo têm é diversificar cada vez mais a pauta de exportação para os chineses.

“Apesar deles serem os maiores parceiros comerciais nossos em valores, hoje eles têm uma pauta muito focada em commodity, então à medida que o tempo passe é importante que a gente vá conseguindo agregar nessa pauta de exportação produtos processados, mesmo produtos do agro, como carnes, farelo, óleo de soja, biocombustíveis”, menciona Palavro. Entre os produtos do agro que avalia ser possível intensificar as vendas para os chineses, ele destaca a carne.

Palavro pondera que, principalmente depois de 2018, com a chegada da peste suína na China, o país asiático já se tornou um dos maiores importadores de carne brasileira, mas diz que ainda há espaço a ser conquistado. “Quando a gente exporta soja para eles, por exemplo, o objetivo principal é para produção de ração lá na China para alimentar o rebanho suíno deles. Seria importante que a gente pulasse algumas etapas e realmente exportasse diretamente carne suína, bovina, cortes especiais, não só o animal inteiro, carcaças inteiras, mas cortes nobres, por exemplo, porque você agrega na cadeia aqui no Brasil”, frisa.

Segundo o consultor, quando se processa a soja aqui no Brasil, a “transforma em carne” no país, isso gera emprego, impostos, uma melhor economia local, e exporta o produto já processado, com valor agregado. “É claro que isso não é uma escolha, é uma política que tem que ir sendo melhorada a cada tempo. E não é ruim que a gente exporte commodities para eles, isso pode continuar, mas é sempre importante que a gente vá dando um passo a mais a cada tempo”, ressalta.

O economista Marcus Antônio Teodoro Batista concorda que agregar valor aos itens goianos exportados é um desafio. Ele acrescenta como exemplo a produção de cana-de-açúcar. Cita que, do produto, é possível extrair cerca de 16 derivados, como a cera da cana para uso em produção de cosméticos, a sucralose (tipo de adoçante) e o plástico biodegradável. “Goiás podia aproveitar a quantidade de derivados da cana-de-açúcar, por ser um grande produtor, para poder pegar carona nessa expectativa de alta de consumo da China”, frisa. O Estado é o segundo maior produtor nacional de cana e, nos primeiros sete meses de 2021, vendeu 56,7 mil toneladas de açúcares para China, equivalente a US$ 16,0 milhões.

Entre outros desafios para aproveitar a perspectiva de maior demanda por produtos do agro, Batista cita a necessidade de o Estado investir mais na parte logística, de tecnologia, que, segundo ele, embora já tenha avanços, ainda há muito para melhorar. Ele aponta também questões como o risco agrícola ainda muito elevado, “principalmente com a mudança climática”, e diz que a parte de crédito também afeta muito o setor, quando o produtor não tem acesso ao recurso na hora que precisa, e menciona que as taxas de juros para captação de recursos ainda são elevadas.

O coordenador institucional do Ifag, Leonardo Machado, acrescenta como desafio: “produzir mais, com maior eficiência e produtividade”. Ele menciona que a questão de áreas disponíveis cada vez menores, bem como a preocupação com o desmatamento, com a produção sustentável, traz para o contexto do agro a necessidade de aproveitar áreas já abertas, como algumas áreas de pastagem degradadas que podem ser mais produtivas e mais diversificadas. “Porque a questão hoje não é só grãos, não é só soja, é todo tipo de proteína animal, todo tipo de carnes”, diz ele, que assegura: “Goiás está se preparando para isso, para produzir mais, produzir mais eficiente e produzir melhor”.

Participação dos 15 principais países de destinos das exportações goianas*

China: 48,61%

Espanha: 4,32%

Tailândia: 3,51%

Países Baixos (Holanda): 3,00%

Estados Unidos: 3,00%

Coreia do Sul: 2,18%

Reino Unido: 2,17%

Índia: 2,04%

Itália: 1,99%

Paquistão: 1,80%

Indonésia: 1,65%

Hong Kong: 1,57%

Bangladesh: 1,50%

Emirados Árabes Unidos: 1,49%

Japão: 1,47%

*Considerando a participação em valor (US$ FOB), no período de janeiro a julho de 2021

Fonte: Balança Comercial do Estado de Goiás – julho 2021

Ações para ampliar oportunidades

Para que os produtores em Goiás estejam preparados para aproveitar as oportunidades de expansão do mercado comprador, o coordenador institucional do Ifag, Leonardo Machado, informa que o Sistema Faeg Senar e Ifag está disponível para poder auxiliá-los em qualquer tipo de entrave que eles possam ter. “A questão de maior competitividade, como questões tributárias, de meio ambiente, tudo isso o Sistema Faeg trabalha para que o produtor tenha cada vez mais melhores condições para produzir”, frisa.

Leonardo Machado informa que o Senar atua com toda a questão de capacitação, principalmente programa ABC, voltado para agricultura de baixo carbono, e outros programas que podem facilitar e favorecer a vida do agricultor. E o Ifag, diz, entra com todo o aporte de informação, de análise, para que o produtor tenha boas informações que facilite a sua tomada de decisão. “O sistema está preparado e tem disponibilizado essas ferramentas para que o produtor goiano atinja o que é necessário para cada vez mais concorrer a novos mercados”, afirma.

Novos mercados

Machado acrescenta que a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) tem feito um trabalho, representando todo o sistema, de promoção dos produtos agro e tem colaborado com o Ministério da Agricultura para abrir novos mercados. “E é nesse sentido que temos trabalhado e buscado atualizar a nossa posição geográfica dentro do mercado de promoção dos nossos produtos lá fora”, considera.

O consultor de mercado Cristiano Palavro destaca que é fundamental o investimento em relacionamento com outros países, pois assim como China tem enorme potencial de crescimento, outros países também têm, em especial países da África, outros países asiáticos, do Oriente Médio, que, segundo ele, são países em franca expansão comercial e econômica e que devem ser foco do mercado goiano e brasileiro. Além de Estados Unidos, Europa, “que são mercados mais consolidados, mas que são sempre uma ótima oportunidade de negócios”.

Ante uma expectativa de retomada das negociações também de forma presencial, que ficou desaquecida neste período de pandemia, Palavro avalia que sai na frente o Estado que se preocupar verdadeiramente com a consolidação dessas ações e que tomem medidas mais rápidas e efetivas nesse sentido. “Existem escritórios do Estado de São Paulo espalhados pelo mundo. Acho que Goiás poderia pensar nisso também e intensificar esse trabalho de feiras, trazer investidores para cá, criar ambientes de negócios mais agressivos, mais pujante para dentro do Estado”, exemplifica. Ele aponta que hoje o trabalho já realizado “não é ruim”, mas pontua: “acho que sempre é possível melhorar”.

Investimentos da China no Brasil

O estudo Investimentos Chineses no Brasil – Histórico, Tendência e Desafios Globais, de Tulio Cariello, diretor de conteúdo e pesquisa do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), aponta que, entre 2007 e 2020, empresas chinesas efetivaram 176 empreendimentos no Brasil, com aportes que somam US$ 66,1 bilhões. De acordo com a publicação, 48% do valor do estoque dos investimentos confirmados entre 2007 e 2020 foram direcionados ao setor de energia elétrica, seguido por extração de petróleo e gás (28%). Agricultura, pecuária e serviços relacionados ficaram com uma fatia de 3%. O estudo ainda mostra que em pouco mais de uma década empresas chinesas investiram em todas as regiões do Brasil, com projetos confirmados em 23 unidades federativas. São Paulo detém o maior número de projetos confirmados entre 2007 e 2020, o equivalente a 31% do total. Na sequência aparecem Minas Gerais (8%), Bahia (7,1%), Rio de Janeiro (6,7%), Goiás (5,4%) e Pará (4,6%).

Fonte: Comunicação Sistema Faeg/Senar/Ifag


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